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Reforma Tributária e Tributação de Dividendos | o que muda para assessorias de investimento

Panorama geral

A tributação de dividendos voltou ao centro do debate no contexto da reforma tributária brasileira. Desde a década de 1990, os lucros e dividendos distribuídos a pessoas físicas no Brasil são isentos de Imposto de Renda (IRPF), algo incomum se buscarmos a legislação tributária internacional e a OCDE. Com a PL busca-se aliviar a tributação sobre a renda do trabalho elevando a faixa de isenção do IRPF mensal para R$ 5 mil e, de outro, compensar a perda de receita tributando lucros e dividendos, hoje não alcançados pelo leão.

Pautados neste argumento de busca por corrigir “distorções” e alinhar o país à prática internacional, o governo federal incluiu a taxação de dividendos em sua pauta de reforma do Imposto de Renda. A proposta de taxar dividendos, que antes considerada politicamente sensível, ganhou força e tem implicações diretas para investidores, empresas e, em particular, para o setor de assessorias de investimento.

Os próximos tópicos detalham o status atual desta medida no Congresso, seus principais pontos e os impactos previstos para profissionais e gestores de investimento.

Status e próximos passos

O tema da tributação de dividendos está materializado no Projeto de Lei nº 1087/2025, de iniciativa do Poder Executivo, que trata da reforma do Imposto de Renda Pessoa Física e integra a agenda mais ampla da reforma tributária. Em julho de 2025, esse PL deu um passo importante: foi aprovado em votação simbólica na Comissão Especial da Câmara dos Deputados criada para analisar as mudanças. O relator do projeto, deputado Arthur Lira (PP-AL), apresentou um substitutivo que foi aceito por unanimidade na comissão, sinalizando amplo acordo em torno das linhas gerais do texto. Após essa aprovação, o projeto seguiu para o plenário da Câmara em regime de urgência (aprovado em 21/08/2025). Isso significa que a análise final pelos deputados será agilizada, o presidente da Casa, Hugo Motta, indicou que a votação deverá ocorrer até setembro de 2025, conforme acordo com os líderes partidários.

Seguindo o rito legislativo, alguns passos ainda são necessários até a aprovação definitiva da nova tributação de dividendos:

  1.      Votação no Plenário da Câmara: O PL 1087/2025 aguardava, em agosto de 2025, a definição de data para votação pelo plenário. Com a urgência aprovada, a pauta não pode atrasar muito; espera-se que os deputados votem o texto em breve (possivelmente até o fim do terceiro trimestre de 2025.
  2.       Análise pelo Senado Federal: Uma vez aprovado na Câmara, o projeto segue para o Senado. Os senadores poderão aprovar o texto como veio, propor emendas ou até rejeitá-lo. Caso o modifiquem, a proposta retorna à Câmara para conciliação das mudanças.
  3.       Sanção presidencial: Aprovado nas duas Casas do Congresso, o PL vai à sanção do Presidente da República. O governo, que propôs a medida, tende a sancionar rapidamente, possivelmente já visando sua vigência a partir do ano-calendário de 2026 (como previsto no texto).
  4.       Regulamentação e vigência: Após sancionada, a lei precisará ser regulamentada pela Receita Federal, detalhando procedimentos de retenção na fonte, formas de compensação no ajuste anual etc. A expectativa é que as novas regras de tributação de dividendos entrem em vigor em janeiro de 2026, acompanhando o início do ano fiscal, com eventuais dispositivos transitórios para evitar efeitos retroativos.


A diretriz é início de vigência a partir do ano-calendário de 2026, com regras de transição para lucros apurados até 2025.

O que a proposta traz, em resumo
  • Isenção ampliada do IRPF: A faixa mensal de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física sobe para R$5.000 mensais. Quem recebe até esse valor em salário ou proventos de aposentadoria, por exemplo, não pagará imposto. Além disso, o substitutivo estende a redução parcial do IR até R$7.350 mensais. Acima desse patamar, a tabela progressiva normal se aplica integralmente.

     

  • Tributação Mínima para Altas Rendas: Institui-se uma espécie de “IRPF mínimo” para contribuintes de alta renda, de forma progressiva até 10%. Isso funcionará como uma alíquota extra aplicada sobre rendimentos hoje isentos ou tributados exclusivamente na fonte (como dividendos) quando a soma anual desses rendimentos ultrapassar R$ 600 mil (equivalente a R$ 50 mil mensais). A alíquota extra começa próxima de 0% nesse limiar e chega ao teto de 10% para rendimentos a partir de R$ 1,2 milhão anuais.

     

  • Retenção na fonte de 10% sobre Dividendos acima de 50 mil: Especificamente quanto aos dividendos, o PL estabelece a cobrança de Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) de 10% sobre os valores distribuídos que excedam R$ 50 mil por mês, por fonte pagadora, para beneficiários residentes no Brasil. Na prática, se um investidor ou sócio receber R$ 60 mil de dividendos de uma empresa em um mês, terá R$ 6 mil retidos na fonte pela empresa ao pagar esses dividendos.

    Importante destacar que esse limite de R$ 50 mil é calculado por empresa pagadora, ou seja, dividendos recebidos de fontes distintas não se somam para efeito da retenção mensal, o que abre espaço para planejamento (como veremos adiante).

     

  • Para não residentes (investidores ou sócios no exterior), a retenção de 10% incidirá sobre qualquer valor distribuído, sem faixa de isenção, equiparando-se a tributação de remessas externas.

     

  •  Compensação no Ajuste Anual: O imposto retido de 10% sobre dividendos funcionará como antecipação, podendo ser compensado na declaração anual de ajuste do IRPF do beneficiário. Ao consolidar todos os rendimentos, o contribuinte calculará se a soma dos seus dividendos e outros rendimentos antes isentos ultrapassou R$ 600 mil no ano-base. Caso sim, será devido o imposto complementar conforme a tabela progressiva mínima (até 10%), abatendo-se o que já foi retido. Caso o total de dividendos isentos não atinja aquele patamar anual, o contribuinte poderá restituir/compensar o imposto retido indevidamente, garantindo que ninguém com renda anual abaixo de R$ 600 mil seja efetivamente tributado por essa nova regra.

     

  •  Limite para Bitributação (Redutor de Alíquota): Para atender às preocupações de dobragem tributária (tributação corporativa + tributação dos dividendos), o projeto prevê um mecanismo de ajuste: se a soma da carga tributária da empresa (IRPJ + CSLL) com a do novo IRPF mínimo do sócio ultrapassar a alíquota nominal combinada em vigor (que pode ser 34% para empresas em geral, ou 40% a 45% para setores específicos, como financeiro), aplica-se um redutor na parcela da pessoa física até que a carga total se limite a esses patamares. Em suma, assegura-se que um negócio não seja onerado acima do que já pagaria, somando 25% IRPJ + 9% CSLL (no caso padrão de 34%). Esse dispositivo traz segurança para empresas de alta lucratividade: caso o sócio já pague 10% sobre dividendos e a empresa tenha pago, por exemplo, 25% sobre o lucro, a carga conjunta de 35% seria reduzida para 34% via abatimento no IR do sócio.

     

  • Regras Transitórias e Exceções: O texto contempla salvaguardas para evitar tributar retroativamente lucros já acumulados. Lucros apurados até o ano-calendário de 2025, com distribuição deliberada até 31/12/2025, ficam isentos da nova tributação na fonte mesmo que pagos posteriormente. Isso incentiva empresas a distribuírem dividendos retidos antes do fim do ano, antecipando-se à vigência da lei. Além disso, foram estabelecidas algumas exceções específicas à incidência dos 10%: dividendos pagos a governos estrangeiros (com reciprocidade de tratamento), a fundos soberanos e a entidades estrangeiras de previdência não sofrerão a retenção. Esses casos especiais visam respeitar acordos internacionais e evitar dupla tributação a investidores institucionais globais.

     

  • PJ-para-PJ permanece isento: dividendos entre empresas domésticas não sofrem nova incidência.
Alguns dos principais efeitos e desafios previstos são:
  1.  Revisão de estruturas e planejamentos tributários: A manutenção da isenção para dividendos pagos de PJ para PJ significa que investidores de grande porte e empresários poderão constituir holdings para centralizar participações e postergar a incidência do imposto. Nessa estrutura, os lucros das empresas operacionais seriam repassados integralmente para a holding sem tributação, e somente quando a holding distribuir aos sócios pessoas físicas é que incidiria o IRRF de 10%. Esse diferimento do imposto permite planejar o momento da tributação. Por exemplo, sincronizando distribuições com anos em que o sócio tenha menos outras rendas, ou reinvestindo os lucros em novos negócios meantime. Diante disso, será necessário revisar estruturas societárias e fluxos de distribuição de lucros/dividendos dos clientes, avaliando riscos, custos e oportunidades de otimização tributária na nova realidade. Assessores de investimento com conhecimento tributário, em conjunto com consultores contábeis e jurídicos, agregarão valor orientando clientes sobre a viabilidade de criação de holdings familiares ou outras estratégias para eficiência fiscal.

     

  2. Ajustes nas recomendações de produtos de investimento: Historicamente, muitas assessorias de investimento enfatizavam produtos com tratamento tributário favorecido:  fundos imobiliários (FIIs) com rendimentos isentos, LCIs/LCAs isentas, entre outros. Esse cenário está mudando: recentemente o governo federal já encerrou a isenção para vários desses instrumentos via medida provisória, e o PL 1087/25 manteve a inclusão desses rendimentos no cálculo do novo imposto mínimo para altas rendas. Embora o texto final possa sofrer ajustes, é claro que a tendência regulatória é eliminar isenções fáceis. Assim, agentes autônomos precisarão reavaliar as alocações recomendadas: por exemplo, ações e fundos de dividendos talvez percam um pouco de atratividade relativa, já que os dividendos acima do limite passarão a pagar 10% (ainda assim, uma alíquota moderada se comparada a outros rendimentos). Poderá haver maior interesse em estratégias de crescimento (empresas que reinvestem lucros em vez de distribuir) ou em produtos de previdência privada e seguros de vida com benefícios fiscais, como forma de planejamento.

     

  3. Planejamento de retiradas para sócios e investidores: Para clientes que são empresários ou detêm participação em empresas, as assessorias deverão orientá-los quanto ao timing das distribuições. Como mencionado, há uma janela até o final de 2025 para distribuir lucros acumulados sem tributação. Além disso, mesmo após a lei, o fato de o limite ser “por fonte pagadora” cria algum espaço para planejamento,  por exemplo, um investidor com várias empresas poderá receber até R$ 50 mil mensais de cada sem disparar a retenção, enquanto concentrar tudo em uma única fonte geraria imposto. Essas nuances precisarão ser cuidadosamente explicadas e utilizadas dentro dos limites legais, evitando configurações artificiais que possam ser questionadas pelo fisco. Em suma, o planejamento financeiro pessoal de muitos clientes de alta renda será impactado: alguns poderão optar por pró-labore (remuneração tributada como salário) até certo ponto em vez de dividendos, outros por venda de participações em vez de distribuição, etc. A assessoria de investimentos, alinhada com consultoria tributária, terá um papel em delinear esses cenários.

     

  4. Capacitação e adaptação do setor de advisory: Internamente, as corretoras e escritórios de investimentos também sentirão efeitos. Muitos agentes autônomos de investimento hoje atuam como pessoas jurídicas para receber comissões e remunerar-se via distribuição de lucros sem IR. Com a nova lei, profissionais que ganham acima do patamar de R$ 50 mil por mês em sua atividade precisarão computar o 10% sobre esse excedente. Embora a maioria talvez não atinja esse nível mensalmente, os top performers ou escritórios maiores podem ver algum aumento de carga tributária em sua receita líquida, o que demanda ajustes (por exemplo, avaliar se permanecer no regime de pessoa jurídica é mais vantajoso). Além disso, haverá a necessidade de atualização profissional: conhecer a fundo as novas regras, sistemas de retenção, impactos nos diversos ativos e veículos de investimento. As assessorias que se posicionarem como especialistas nesse novo ambiente tributário poderão conquistar a confiança de gestores e investidores preocupados em manter a rentabilidade pós-impostos de suas carteiras.

A implementação da tributação de dividendos no Brasil, parte importante da atual reforma tributária, já é uma realidade iminente. Com aprovação na comissão especial e respaldo político expressivo, a medida caminha para ser votada no Congresso e, ao que tudo indica, deve entrar em vigor em 2026

Para gestores e profissionais de investimento, trata-se de um momento de inflexão. Estruturas até então eficientes podem precisar ser repensadas, e decisões de alocação devem considerar o efeito dos impostos sobre os retornos. Quem possui empresas ou investimentos significativos deverá se preparar para novas obrigações e talvez aproveitar 2025 para ajustes pontuais (como distribuir lucros acumulados) antes das mudanças

Contar com um parceiro especializado nesse nicho de mercado pode fazer toda a diferença. Em outras palavras, buscar assessoria profissional voltada à otimização tributária dos investimentos é a melhor forma de navegar por essas mudanças.